Blog

Variedade

O Tempo Acabou

Hollywood chacoalhou a sociedade nestas últimas semanas. O debate sobre sexismo e misoginia ressurgiu após a publicação de uma reportagem do New York Times que apontou o produtor Harvey Weinstein como o responsável por três estupros e vários casos de assédio sexual. A delação aconteceu por meio da atriz Ashley Judd (Divergente), que relembrou o começo de sua carreira, quando o executivo marcou uma reunião com ela e na ocasião vestindo apenas um roupão de banho pediu para que ela lhe fizesse massagem e também o assistisse tomando banho.

O relato foi o estopim para desencadear uma série de outros não menos impactantes e porque não dizer repugnantes. Houve, inclusive, um ator, Anthony Rapp, que admitiu ter sofrido assédio, quando tinha 14 anos de idade, pelo também ator Kevin Spacey. Atrizes de renome resolveram liderar uma campanha que protagonizou um capítulo especial na última cerimonia do Globo de Ouro, uma das maiores premiações do cinema.

Ophra Winfrey, homenageada, abriu a noite com um duro e contundente discurso contra o assédio e o racismo. As palavras pronunciadas em um Hotel de Los Angeles, local do evento, reverberaram em todos os cantos do globe, viralizando nas redes sociais e agitando toda imprensa internacional.

O movimentou ganhou uma hastag (#metoo) e seguiu amealhando mais e mais adesões. O assunto é sério e é mais que providencial que estejamos discutindo esse tema tão espinhoso, não somente para as mulheres, mas para a sociedade de um modo geral.

Em meio a tantas abordagens já era de se esperar o brotar de opiniões equivocadas e conflitantes. Daí a oportunidade, ainda que neste apertado espaço, de aproximar alguns aspectos que possam reforçar o nosso pensamento e municiar ainda mais a reflexão sobre a questão.

O assédio sexual é um dos crimes mais praticados na humanidade, e atinge principalmente as mulheres. No entanto, somente a partir do ano de 2001, através da Lei n. 10.224, é que esse comportamento medonho apareceu de forma mais clara no Código Penal, através do dispositivo 216-A. “Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função” é crime de assédio sexual.

Note que para a tipificação do delito é condição sine qua non que o agente, ou seja, aquele que está constrangendo, o faça na intenção de auferir algum tipo de ganho sexual, valendo-se de sua superioridade sobre a vítima. Essa ascendência, que fique claro, não é física, mas moral.

Pois bem, então quando falamos de assédio sexual não estamos nos referindo aquela cantada grosseira ou a uma aproximação desajeitada. Isso é outra história, que nada tem a ver com o crime em si. O assédio sexual é um ato cruel e covarde, que na maioria das vezes deixa marcas indeléveis sobre a vítima. A paquera inconveniente não deixa de ser algo reprovável, mas está totalmente dissociada do objeto em tela.

Aliás, curiosamente, a origem da palavra paquera surgiu por causa das pacas (animal roedor). O paqueiro partia para “paquerar” (caçar as pacas), estudando o momento certo de fazer a captura do animal.

Em todo processo de restruturação, ainda que moral, é necessária uma boa dose de resiliência e ponderação para que os ajustes sejam efetivamente realizados.  Não se muda uma sociedade machista da noite para o dia. A mira não deve ser apontada tão somente para os homens, pois o pensamento machista povoa, inclusive, as mentes femininas.  Bradar e insurgir-se são atitudes sempre muito bem-vindas, porém o fundamental para toda mudança é o exercício do debate de forma lúcida. A palavra, embora mais homeopática, constrói pensamentos mais sólidos do que a alopatia da truculência.

Tenho certeza que você não quer mais ter que ceder aos caprichos do chefe; que não quer ter que recusar a oferta de um emprego por pressentir problemas futuros; que não quer conviver com o medo da perda e aceitar a submissão. Tenho certeza que você não quer encontrar sua filha, sua esposa ou sua irmã chorando em silêncio por ter sido vítima de um assédio sexual.

Precisamos transformar e construir uma sociedade melhor. Do que adianta evoluir tecnologicamente se pessoalmente estamos estagnados? Dê voz ao seu protesto. O silêncio está rompido, Time’s Up (O tempo acabou).

Autor: Jansen Oliveira